As bundas expostas da sociedade.
Atualizado: 3 de Out de 2020
Rua Dias Ferreira, uma das mais movimentadas do Leblon.
Ali, onde já foram notáveis os restaurantes Bozó, Pronto, mais tarde o Sushi Leblon, o Venga!, CT Boucherie, o Togu e... chega, porque isso aqui não é guia de restaurantes, abundou assunto para disse-me-disses e bafafás.
Nessa rua, famosa também por cruzar o bairro mais chique do Rio ligando a Bartolomeu Mitre à Ataulfo de Paiva, ainda que as mesmas duas ruas se cruzem mais à frente permitindo que o motorista possa, se for bem xarope, ficar rodeando o bairro sem sair das duas ruas, num looping eterno, foi que tudo aconteceu.
Uma moça, que diz morar na praia, mas não sabe que a rua onde estava se chama Dias Ferreira, junto com outra moça e um rapaz da Petrobras, punha a bunda na janela, como se faz quando se quer aparecer – na gíria e, às vezes, na realidade.
Na janela, é modo de se dizer, já que você que pensa em me desmentir sabe muito bem que a poupança tinha estourado o teto da meta – a de atrair a atenção dos demais participantes do baile dos desmascarados.
Rua completamente lotada, não satisfeita em dar vazão ao teor etílico via arrebitamento rabiolal, a local resolveu compartilhar sua língua com os demais passageiros do bólido conversível.
Como tudo num conversível é visível, viam-se os beijos e a nobre região da moradora da nobre região.
Mais eis que, não satisfeita com a visão do vão central da ponte Rio-Niterói da lambisgóia, que lambia Goya, pensando, talvez, em Picasso, uma nova protagonista do bairro que já teve Tom Jobim capitaneando sua mesa cativa à entrada do imenso e feio salão da Churrascaria Plataforma, resolveu atrapalhar o engarrafamento.
Atirando garrafas, evidente, que é coisa que se faz para que o rebento não veja mau exemplo por aí: por essas ruas famosas de desconhecedoras do Leblon.
E a justiça feita com as próprias mãos, passou a ser feita com as próprias Minalbas cheias de gás.
O resto já sabemos.
Teve tapa, teve arranca rabo; digo, isso não teve, mas teve arranca top do biquíni, gritaria, corre-corre, matéria no Fantástico e, claro, um desfile de declarações repletas de profundidade e inteligência.
Destaque para a da agressora que se sentiu agredida, que disse que a moça da bunda estava "praticando preliminares na frente de todo mundo".
Eu não sei como é a vida sexual dessa pessoa, mas temo que alguém não lhe tenha explicado bem como a atividade é praticada.
Corte rápido e vamos para o desbunde paulistano.
Um médico com CRM válido, préeéeééé (som de freada).
Meu pai é médico.
Você conhece muitos médicos.
Talvez você até seja médico.
Você já ouviu falar de algum médico que se apresente como um médico com CRM válido?
Melhor buscarmos uma segunda opinião.
O fato é que o médico do CRM válido diz que chegou ao Gero às 9 da noite.
Mas os amigos atrasaram. Por isso ele queria comer às 9:50.
10 minutos antes de o restaurante ter que fechar, por lei.
O pobre Ismael, maître que uma matéria do Uol chamou de metri, foi arrolado na confusão.
O doutor especialista em barraco resolveu que ele não tinha culpa de os amigos terem chegado tarde, ué.
E deu para meter a língua também.
Nos dentes.
De garganta ele não deve entender, já que a gritaria foi de destruir amígdala e corda vocal junto.
Como se houvesse pegado a ponte aérea, outra justiceira sem claquete resolveu que tinha que gritar também; e vaiar o cara dentro do restaurante.
E como bunda na janela é atividade tanto lá quanto cá, resolveu, claro, que tinha que expor tudo e todos nas redes sociais.
Aí teve discussão sobre o meu delegado ser maior que o seu, chute na canela e, por sorte, ninguém ficou sem sutiã.
Chamou-se pai de careca, mãe de cabeluda e vó de raspadinha.
Porque ali tem educação europeia, educação americana.
E eu morro de pena que em texto escrito a gente não consegue imitar sotaque.
Mais um jump cut e vamos aos Estados Unidos, onde também tem muita gente com educação americana.
E encontramos Trump.
Agora de longe, porque pegou Covid – e todo mundo, muito sincero, está lhe desejando um pronto reestabelecimento.
Aqui de casa nós também desejamos o mesmo: digo, o mesmo que também havíamos desejado ao Bolsonaro.
De volta ao tema, Trump é acusado de sonegar impostos.
Pagou 750 manguitos nos dois últimos anos, o bilionário.
Às vésperas da eleição, já teria perdido fácil, se não fosse o mundo polarizado, primitivo, do moralismo das garrafadas e do "sabe com quem está falando?" em que vivemos em pleno século XXI.
A verdade é que a sociedade está com tudo à mostra, com tudo exposto, como nunca esteve antes.
Aí sim, graças à tecnologia veloz que também destrói tudo de bom que vínhamos construindo, como sociedade, a duras penas, até aqui.
E se há algo que une um negacionista retrógrado preconceituoso misógino homofóbico xenófobo mentiroso aos acontecimentos do Leblon e dos Jardins é que a desumanidade, parece, não está dando certo.
Quem sabe a humanidade ainda dê.
De todo modo, imagino que Trump, anfitrião do mesmo baile dos desmascarados, agora não esteja se sentindo assim tão imune a tudo.
Seja por conta do Fisco americano, seja por conta da Covid, como bem sabe a moça do Leblon, quem tem bunda tem medo.