Diário do vírus - Capítulo 6
USA - Flórida
Depois de ter feito um estrago (que continua) em New York, embarquei para Miami a bordo de um hospedeiro que se juntaria à comitiva do governo brasileiro em um encontro com Donald Trump.
O resort de Mar-a-Lago, com seus 126 aposentos, é uma especie de home office de verão de Trump na Flórida, e na já contaminada Manhattan, a sua Trump Tower não seria o local mais adequado para oferecer um jantar a seu colega, Jair Bolsonaro.
Para mim, uma farra, uma farra. Só de celebridades políticas, infectei o prefeito de Miami e mais de vinte figurões que acompanhavam o presidente brasileiro.
Como efeito colateral, somei 153 funcionários do resort aos 22 milhões de gringos que se enfileiram para pedir auxílio-desemprego nos guiches de assistência social dos EUA.
Eu estava alojado no intérprete - não o de Libras - da comitiva, que passou a assistir Bolsonaro depois de o terem convencido de que seu filho Eduardo nunca passou da lesson one do the book in on the table.
Enquanto o chanceler Ernéscio Araujo levava Zero 1, Zero 2 e Zero 3 para brincadeiras no gramado, eu participava do curtíssimo diálogo travado entre as duas autoridades.
- Donald, colega, qual foi a mais recente medida tomada por você na crise desse coronavírus aí?
- #FireFauci.
- E o que você acha que eu devo fazer no meu amado Brasil?
No dia seguinte fomos ao ateliê de Romero Britto cumprir agenda social.
Já havia gente ali febril e tossindo sem parar, mas, como no agitado bar de Nova York, aqueles brasileiros não pareciam se importar.
No som, tocava uma valsinha de João Bosco e Aldir Blanc, cuja letra carregava uma mensagem sombriamente premonitória:
‘Perdigoto, cascata, tosse, escarro,
um choro soluçante que não pára,
piada suja, bofetão na cara
e essa vontade de soltar um barro’
O nome da canção? ‘Bandalhismo’.
É de 1980, mas é tão 2020.